A COUPLE OF STRUCTURING AND LIQUID THINGS

Henrique Palmeirim Lázaro

Por Helena Mendes Pereira

 

“Pinto, raspo, penso”, frase de outro artista, Miguel d’Alte (1954-2007), natural de Braga, também ele um experimentalista e um combatente da opressão criativa. Henrique Lázaro (n.1995) nasceu em Lisboa, curiosamente, mas é de Braga que se sente desde sempre, tendo passado alguns períodos da infância também em África. Atualmente vive em Londres, cidade onde completou o mestrado (Fine Art), tendo frequentado a prestigiada Goldsmiths, University of London. Foi para Londres depois de terminar o 1o ciclo de estudos em Artes Plásticas – Pintura pela Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa (FBAUL), merecendo distinção entre os seus professores e colegas.

A primeira peça, da sua produção, que me impressionou, ainda que se aparentasse com um qualquer tipo de tecido, foi feita única e exclusivamente com fita adesiva de papel. Tratava-se de uma espécie de molde do nicho que constituía outrora o altar da capela do Convento, hoje FBAUL. “É uma planificação física deste espaço. Só mais tarde me apercebi que este objeto site specific (que pela sua forma, proporções e textura aparenta ser um pano) me reenvia para o Santo Sudário. Os dois transportam em si a marca ou impressão de um contato”, nas palavras do artista que, apesar de muito jovem, revela uma densidade intelectual que contagia, conceptualmente, as suas criações plásticas.

Descobrir a pintura de Henrique Lázaro é confrontar-nos com um conjunto de conceitos opostos e, acima de tudo, é desafiarmos as definições cerradas que construímos quotidianamente, de forma mais ou menos consciente. Aliás, chamar-lhes apenas pintura é diminuir estas obras da enorme complexidade técnica que carregam. São camadas sobre camadas de matéria, oscilante entre váriastipologias, que se sobrepõem com os recursos disponíveis, e que podem ir do pincel à espátula, passando pelas inevitáveis fricções do próprio corpo contra o suporte. Poderíamos chamar-lhe gestual, enquadrá-la no ressurgimento expressionista americano dos anos de 1940/50, protagonizado por Pollock (1912-1956) ou Rothko (1912-1970), mas também nas associações lhe retiramos novidade, ainda que seja difícil negar influências e referências.

As obras de Henrique Lázaro são pintura, textura e fúria. Depois da saturação matérica do suporte, sempre de paleta definida, surgem golpes, cortes e outras agressões, chamar-lhe-emos assim, do artista à obra de arte e à sua dimensão sacra. Novas recorrências da grande questão teórica dos anos 1980 e extensão dramática expressiva do artista, do jovem artista em formação. Não lhe chamaríamos abstrato, até porque o autor é afirmativo quando nos diz partir de um detalhe de quotidiano, de uma combinação de textura, cor e lugar que reteve. Neste caso, antes expansão em que o gesto primitivo se funde com a vanguarda.

Há muito que o queríamos a expor na zet gallery e, desta feita, o seu hibridismo enquadra-se no conceito amplo de mais uma exposição que foi sonhada no tempo, construída nas conversas e nas partilhas com os artistas, maturada no inusitado destes tempos que temos vivido. Demos-lhe a primazia da janela que convida os nossos públicos e ele ocupou-a, alojou-se a olhar o mundo a partir daqui, da nossa casa. A pintura é objeto, instala-se mas nunca deixa de ser pintura pura, densa, intensa. Veio-nos de Londres de regresso (temporário) a casa e temos o orgulho imenso que continuar a ser a partir daqui que o lançamos, também a ele, para o território dos eternos gigantes.

Helena Mendes Pereira

 

Conheça mais sobre o artista e o seu trabalho em https://zet.gallery/artist/henrique-lazaro-7459.

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