2 ou 3 choses que je sais d’elle

“2 ou 3 choses que je sais d’elle” é o nome de um filme que Jean-Luc Godard (FR, 1930) realiza em 1966, no mesmo ano de “Masculin féminin” e “Made in USA” e depois de um conjunto de produções em que o Nouveau Réalisme, de que deriva o cinema Nouvelle Vague, atenta na condição social da mulher, filmando-a como verdadeira protagonista das narrativas, ou seja, com a câmara a registar a cena a partir do olhar dela e não, apenas e só, com os olhos no corpo dela. O cinema de Godard é feminista e vai-se constituir como um dos símbolos das lutas da geração que sairá para a rua em 1968.

Um dos temas abordados por Godard é o da prostituição como sintoma, por um lado, da crise social que atravessava a França e, por outro, como alternativa das mulheres para conseguirem auferir rendimentos que lhes permitissem sobreviver sem ser na dependência de um homem, pai ou marido. Ser mulher significava, como ainda hoje se verifica em muitos contextos laborais, auferir menores salários e ter menos condições de acesso a determinados postos de trabalho, onde se incluem lugares de liderança, do que o verificado para os homens. Na metáfora de Paris como cidade-mulher, 55 anos depois, ainda há tanto por fazer e ser mulher continua a ser uma tarefa revestida de dureza e com muito pouca margem de erro.

É pois tão absurdo falar da “mulher” em geral como dum “homem” eterno. E compreende-se porque todas as comparações com que se esforçam por decidir se a mulher é superior, inferior ou igual ao homem são inúteis: as situações são profundamente diferentes. Confrontando-se tais situações, é evidente que a do homem é preferível; isto é, ele tem muito mais possibilidades concretas de projetar a sua liberdade no mundo; daí resulta, necessariamente, que as realizações masculinas são mais importantes que as das mulheres; a estas é quase proibido fazer alguma coisa. Contudo, confrontar o uso quanto aos limites que os homens e as mulheres fazem da sua liberdade é, a priori, uma tentativa desprovida de sentido, posto que, precisamente, eles a empregam livremente. Sob formas diversas, as armadilhas da má-fé, as mistificações da seriedade ameaçam tanto uns como outros; a liberdade encontra-se inteira em cada um. Porém, como permanece abstrata e vazia na mulher, esta só poderia assumir-se autenticamente na revolta: é o único caminho aberto aos que não têm a possibilidade de construir o que quer que seja; cumpre-lhes recusar os limites da sua situação e procurar abrir para si os caminhos do futuro; a resignação não passa de uma demissão e de uma fuga; não há para a mulher outra saída senão trabalhar pela sua libertação.[1]

2 ou 3 choses que je sais d’elle” é, neste caso, o nome da exposição que a zet gallery terá patente de 12 de junho a 4 de setembro de 2021. Reúne obras de Elizabeth Leite (VE, 1982), Helena Cardoso (PT, 1940), Inês Osório (PT, 1984), Liliana Velho (PT, 1985), Márcia Ruberti (BR, 1965), Teresa TAF (PT, 1987) e Xana Abreu (PT, 1975) e integra-se num ciclo de exposições e de programação em que a zet gallery destacará artistas mulheres, considerando a urgência social que atravessamos e que torna indelével a discussão e a luta sobre a igualdade de género.

Em 2020, uma das perguntas dos cibernautas que dominaram os motores de busca foi “como bater numa mulher sem deixar marcas?”, ainda que, segundo a estatística oficial, tenha havido uma ligeira diminuição do número de mulheres mortas em contexto de relações conjugais, bem como do número de queixas por violência doméstica. Sabemos que no reino do medo, as queixas são silenciadas pela fome. É senso comum que, em contexto de pandemia, foram as mulheres que mais sacrificaram carreiras, ficando em casa com os filhos, numa espécie de cenário disfarçado pela figura jurídica do “teletrabalho”. Precisaremos de mais alguns anos para quantificarmos as regressões de décadas de conquistas femininas consequentes à Covid-19, como precisaremos do dobro do tempo da luta para delas recuperarmos. A pandemia protegeu a sociedade patriarcal instituída e é nossa obrigação ser exemplo no combate contra todas as desigualdades.

Neste sentido, a zet gallery retoma a sua extensão de programação privilegiando a Arte com assinatura no feminino, revelando, a partir de cada uma destas autoras, as formas de ver e sentir delas, desvendando o lugar da tempestade interior que é tantas vezes a força motriz do mundo inteiro.

Escreveu Jean-Paul Satre (1905-1980), o outro, como Simone, amante da liberdade, que “Um amor, uma carreira, uma revolução: outras tantas coisas que se começam sem saber como acabarão.” Apetece-me, sobre esta exposição, afirmar que a sonhei nos idos das minhas lutas e causas, nunca antevendo que esta acabaria por se tornar numa tão ambicionada exposição com propostas de ativação da participação direta dos públicos na continuação dos processos artísticos.

Um caso que devemos ter presente, amplamente estudado pela nova ciência que se chama proxémica, é a relação condicionante do espaço sobre o indivíduo. A proxémica ensina-nos que viver num espaço muito restrito leva à neurose; logo, não devemos fechar este espaço já pequeno com paredes e divisórias, mas sim achar uma outra forma de o tornar funcional, deixando-o mais aberto possível: a vista de todo o teto pode ser suficiente para não dar a ideia de espaço restrito.[2]

Poderíamos afirmar que a proxémica e as suas evidências são uma das marcas do passado recente, quase ainda presente, que vivemos. Confinar num apartamento pode revelar-se uma experiência transformadora, podendo começar por levar-nos a transformar o espaço em volta, no exercício difícil de inventar intervalos, zonas de respiração. Somos seres que acumulam, que agregam e acrescentam elementos aos dias, muito para lá dos patamares da primeira, segunda ou terceira necessidade e, durante os períodos de confinamento que vivemos, dei por mim a abusar da minha obsessão pela arrumação, pela ordem no espaço.

A presença das obras de arte e das estantes repletas de livros, indiciam uma necessidade de organização que a neurociência explica mas que, no meu caso, fez sempre parte do meu próprio processo de equilíbrio mental. As arrumações incluíram remodelações e reformas, aquisições de mobiliário em falta e troca de eletrodomésticos obsoletos e, sobretudo, uma profunda reestruturação do que fazia e não fazia sentido continuar a ocupar roupeiros, por corresponder, ou não, à revolução interior em curso. Os sapatos são símbolos de muitos estereótipos, construtores de muitas narrativas e de autoimagens.

Ao longo dos anos acumulei dezenas de pares daqueles que se compram e usam uma única vez, em determinada efeméride, e não se repetem porque têm o dom de deixar mazelas e de nos criar uma sensação atroz de desconforto, um desconforto que nos faz questionar se o padrão de beleza feminino que se instituiu na década de 1950 e que, em tantos momentos, continua a vigorar, é sintomático e enquadrável num modelo individual de felicidade que cabe a cada um procurar e descobrir. Uma das lições que o isolamento social nos impõe é esta de sermos obrigados a estar só connosco, sem distrações, num exercício de perguntas e respostas capaz de combater as consequências da proxémica.

Entre as perguntas e as arrumações – que se repetiam ao longo dos dias de confinamento como se isso significasse que o apartamento era infindável, sem limites de área e, por isso, sempre com algo para organizar – dá-se um excedente de dezenas de pares de sapatos que se agruparam em meia dúzia de caixas. O que fazer agora com aquele corpo desintegrado de estereótipos para pés? Decidi-me a lançar um desafio a artistas plásticos e visuais, através das redes sociais Facebook e Instagram, para a criação de um objeto artístico a partir de todos aqueles sapatos.

A Inês Osório reagiu e eu queria muito que fosse a Inês porque sabia que nas suas obsessões temáticas, feitas de um desenho puro que se torna matéria e forma, de interação bi ou tridimensional, iriam saber interpretar a rudeza e o desconforto daquele acumular. A Inês Osório perseguiu os conceitos e palavras chave que a sua produção vinha explorando, nomeadamente a ideia de liberdade, ou a perda dela que sentimos neste período incrédulo da nossa história comum, e com os sapatos do desconforto e, por isso, da castração, construiu asas para mulheres livres, asas para seres humanos que ousam sonhar. Nas voltas do exercício, que a Inês ligou à produção anterior associada aos desenhos de fios que marcaram o seu ano de 2020, numa combinação deslumbrante de delicadeza e força, estas asas ganharam a tonalidade do branco que é luz, desafiando assim as sombras do espaço expográfico. Inês Osório, que se afirma escultora, combina na sua produção os desafios do desenho multimeios e da adaptação de formas e matérias a conceitos site specific, interessando-se por uma diversidade de materiais e tecnologias que incluem metais mais dúcteis, têxtil e o papel como a sede do pensamento, feito, neste caso, asas de carvão que aludem à pesquisa.

A construção concetual, primeiro pessoal e depois coletiva, adjacente a todo este processo curatorial, tem, então, início num processo de desconstrução dos meus próprios estereótipos sobre uma certa imagem feminina associada à elegância, à sobriedade, mas com uma extensa dramatização do corpo enquanto instrumento e referencial. A partir desta purga, começou o desenlace sobre estas 2 ou 3 coisas que queremos ver desvendadas sobre estas, e sobre todas as mulheres e, em particular, sobre estas mulheres que têm em si a peculiaridade da Arte e o privilégio da criação, absoluta e eterna, de todas as perguntas que interessam e que só a matéria (ou antimatéria) artística consegue questionar.

As tendências individuais da arte participativa – o lúdico e/ou didático, o “pastoral” e o “sociológico” – têm pelo menos uma coisa em comum: o contexto da crítica institucional, a crítica ao carácter socialmente excludente da instituição de arte, que contrariam com práticas “inclusivas”. Para todos eles, “participação” significa mais do que apenas expandir o círculo de destinatários. A forma de participação e os próprios participantes tornam-se fatores constitutivos de conteúdo, método e aspetos estéticos.[3]

Correntes mais recentes de pensamento sobre a curadoria e as suas tendências, considerando que há um antes e um depois dos novos media digitais e das formas de interação com os espetadores que potenciam, refletem sobre a arte participativa ou sobre como uma exposição, um projeto de curadoria, pode incitar à participação dos públicos e, com ela, suscitar reflexões sobre temáticas de interesse geral ou particular. Como é que uma visita a uma exposição pode ser uma forma de ativação cívica e de pensamento crítico? Este era um processo que nos interessava integrar nesta nova exposição.

O primeiro exercício partiu, mais uma vez, dos ditos sapatos e do estereótipo que carregam. Decidimo-nos a indigitar os públicos à libertação dos estereótipos, pintando de branco mais alguns pares do desconforto. A tinta serve-se de panela, sendo este apenas o primeiro símbolo da vida doméstica, que em muito e em tudo ainda hoje se associa, quase exclusivamente, à mulher. A cor que mascara é a cor que liberta, tal como de brancas fez a Inês as asas que têm os meus pés em dor nelas.

No cume das estórias de que é feita esta exposição, descobri em Viseu a Liliana Velho, artista que privilegia a cerâmica, levando a cabo, sobretudo, instalações de objetos em polípticos de pequeno porte, na cedência às medidas dos fornos regularmente disponíveis. A artista, ceramista, integra esta exposição com duas instalações: “Artefactos para rituais” e “Coração em contramão”, complementam-se na ironia de “Receita para desamar”, com uma mensagem que convoca os iminentes sentimentos femininos. Os públicos são desafiados a levar e a deixar receitas, como se o amor coubesse em fórmulas e (des)gostar fosse de desígnio igual para cada uma de nós. A obra de Liliana Velho tem a simultaneidade da fragilidade e da rudeza da cerâmica, na metáfora perfeita do feminino inacabado no forno das formas em cor.

Conheci a Helena Cardoso e a sua produção artística, que tem por base um profundo conhecimento dos processos associados ao têxtil e, nomeadamente, ao trabalho artesanal do linho, através de um outro projeto que a zet gallery tinha a decorrer na Casa da Lã, em Bucos, Cabeceiras de Basto. Há um conjunto largo de artistas que exploram os processos têxteis que me têm interessado ao longo dos últimos anos, nomeadamente a chinesa Lin Tianmiao (n.1961) ou a israelita Dvora Morag (n.1949) que abordam as possibilidades do quotidiano feminino, os conceitos de memória e de tradição em instalações de grande formato. O têxtil é, para além de uma tecnologia de múltiplas possibilidades, a própria experiência da catarse da mulher a quem sempre se associaram estes ofícios, votados à casa ou à servidão das fábricas da industrialização e da capitalização dos nossos extensos roupeiros, de que todos, mais ou menos, somos orgulhosas vítimas. Helena Cardoso cria panos, com uma profusão de materiais, como se fossem pautas de música, ritmos para cantar, estórias que se desenvolvem na horizontalidade que faz os verticais. Encantou-me quando as vi pela primeira vez, de um belo sublime mas na semiótica da paciência que, aplicada à mulher, e a esta mulher artista ainda mais, têm o sabor de um quase pleonasmo. Helena Cardoso é, ainda, um daqueles casos paradigmáticos de uma artista que a vida deixou no anonimato. A família, os filhos, a casa tornaram-na invisível, não obstante nunca ter abdicado da sua produção artística e de participar, aqui e ali, em exposições. Mas merece mais, merece uma voz urgente no auge dos seus 80 anos.

Teresa TAF, “Renascer” e “Pertencer e habitar a matéria em busca de ser-com-o-mundo”, dois resultados multidisciplinares em que aborda o processo base da pintura e, sobretudo, a pesquisa pelos pigmentos presentes na natureza e no quotidiano. Neste caso, a artista trabalhou, ao longo de vários meses, em diferentes territórios do vinho e da vinha, mergulhando, literalmente, no néctar dos deuses, explorando os processos artesanais e explorando o tingimento do corpo e, também, do têxtil. O vinho, cor de sangue, tem a presença simbólica forte da ritualização que, ancestralmente, se associa à mulher e aos seus mistérios e ciclos. Artista plástica e visual de uma enorme maturidade, a sua produção integra disciplinas como a performance, a fotografia e o vídeo em instalações que dispõe como percursos e desenhos pictóricos no espaço, combinando processos artesanais e digitais que se revelam de uma deambulante poesia. Com Teresa TAF a mulher renasce, mas também regressa ao habitat, ao centro do templo, ao ventre do mundo.

Elizabeth Leite tem feito parte das escolhas da zet gallery ao longo dos últimos anos e a seleção de obras que aqui apresenta são reflexo de um caminho em que se liberta do excesso e do cheio da pintura, para permitir que o desenho viva e se evidencie, que os suportes respirem e que o espetador tenha espaço para criar narrativas complementares do vazio. Elizabeth Leite observa o mundo, começando por tomar-se como exemplo das histórias que nos quer contar. É um dos bons nomes da expressão pictórica, de tendência figurativa, da sua geração. A seleção de trabalhos para esta exposição integra três sequências narrativas: uma expressa a sua saturação com as funções de mãe e dona de casa; outra conta-nos a história da vizinha Bina que viveu sempre sozinha, assistindo à morte de cada um dos elementos da sua família direta, sem ter tido namorados ou maridos dignos de intimidade geminada; a terceira é a vida de todas as avós, amas dos netos. Três mulheres, três tipos, três realidades próximas de nós, três contextos de desigualdade social profunda, provenientes dos escombros do doméstico. Nunca, como nesta exposição, a minha intervenção curatorial havia sido tão autoral e, às obras de Elizabeth Leite ousei somar a bacia em que cora a blusa de bordado inglês, que me remete para a minha vivência infantil, também ela com as mulheres em casa, entre os tachos e as bacias, nos rituais do amor e já em busca da libertação e da emancipação.

Os museus e as galerias devem ser representativos das comunidades em que atuam e, ao mesmo tempo, acompanhar as mudanças e as alterações nessas mesmas comunidades. Márcia Ruberti é uma entre dezenas de milhares de cidadãos de nacionalidade brasileira que, nos últimos anos, escolheram Portugal para viver. Braga é um reflexo destes fluxos migratórios e a zet gallery também pretende espelhar o seu contexto local, em diferentes escalas. Desde que chegou a Portugal, depois de uma carreira de décadas dedicada ao marketing e à gestão, Márcia Ruberti mergulhou na escultura em busca da sua versão de um Giacometti (1901-1966), assoberbado pelas tendências neodadaístas. Quando, em visita ao seu atelier, descobri estes objetos em que as cadeiras, símbolos de poder mas também de quotidiano doméstico, se alteravam à presença das esculturas ou das associações livres de objetos encontrados, à maneira surrealista, não tive dúvidas em a desafiar a integrar esta exposição, integrando assim a sua visão do mundo nestes mundos femininos aqui propostos e, sobretudo, porque o que nos apresenta reflete as suas recolhas e a atenção à urbe e aos vestígios que guarda e expele.

Xana Abreu é uma artista plástica, mais uma, que, ainda que formada na Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa, fez outro caminho, tendo-se notabilizado através de outras formas de expressão artística. Mas pintar é a essência dela e quando nos conhecemos senti que ficaríamos ligadas para sempre. O seu trabalho mais divulgado é, igualmente, de natureza figurativa, com a influência do surreal e do fantástico, em sublimes execuções técnicas e na imaginação densa das estórias que as suas obras contam. No decorrer do ano de 2020, colaboramos em diferentes projetos, nos quais se inclui uma exposição dela em Madrid; a primeira residência artística do AMAR O MINHO, projeto que integra os 24 municípios do Minho e que tem coordenação artística e de comunicação da zet gallery; e as ilustrações que fez para o meu segundo livro de prosa-poética “apenas literatura e não outra coisa qualquer”. Para o livro, escolhemos obras suas de natureza não mimética mas mais livre e plástica, em que define um alfabeto de formas e uma paleta de sonho, em que identificamos toda a sua produção plástica. Xana Abreu ocupa, nesta exposição, o único convite direto à contemplação e à calma, um convite a olhar devagar e a não ter pressa, a merecer a surpresa de descobrir uma artista que esperou o seu tempo e que é dona de uma riqueza gestual que impressiona. Porque o que nos impressiona, de facto, é a mulher que pinta no seu próprio mundo, isolada do barulho das luzes e confinada na sua própria verdade e pureza.

A zet gallery, mais do que uma galeria comercial, pretende afirmar-se como uma estrutura de programação e de incentivo à criação artística, fundamentalmente, no campo das artes plásticas e visuais, tomando para a Arte o poder de ser a alavanca para se pensar o mundo e se atuar a partir do pensamento. Esta exposição é uma ação e um alerta sobre o tema da urgência das igualdades de oportunidades para todos, independentemente do género, credo, raça, condição social de partida ou das circunstâncias que a vida traz. É um projeto de curadoria que se escreve no feminino, que revela e esconde o que é ser mulher mas, sobretudo, que tem o desejo do belo e a evidência do tempo e do espaço de cada uma em que cada um se revê ou repele. É um exercício pela Liberdade e contra a servidão, sempre!

Todas as coisas que têm sentimento sentem, pois, a dor da sujeição e suspiram pela liberdade; as alimárias feitas para servirem o homem não são capazes de se habituar à servidão sem protestarem desejos contrários. A que azar, pois, se deverá que o homem, livre por natureza, tenha perdido a memória da sua condição e o desejo de a ela regressar?[4]

Helena Mendes Pereira

 

[1] BEAUVOIR, Simone de – O Segundo Sexo. Volume 2. Lisboa: Quetzal Editores, 2018 (2ª edição). Página 465.

[2] MUNARI, Bruno – Das Coisas Nascem Coisas. Lisboa: Edições 70, 2004. Página 172.

[3] “Working on the Community” (1998) de KRAVAGNA, Christian citado em GRAHAM, Beryl e COOK, Sarah – Rethinking Curating. Art after New Media. Londres: The MIT Press, 2015. Página 111.

[4] LA BOÉTIE – Discurso sobre a servidão voluntária. Lisboa: Antígona, 2020 (4ª edição). Página 29.

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